Já estou voltando. Só tenho 37
anos e já estou fazendo o caminho de volta. Até o ano passado eu ainda estava
indo. Indo morar no apartamento mais alto do prédio mais alto do bairro mais
nobre. Indo comprar o carro do ano, a bolsa de marca, a roupa da moda.
Claro que para isso, durante o
caminho de ida, eu fazia hora extra, fazia serão, fazia dos fins de semana
eternas segundas-feiras. Até que um dia, meu filho quase chamou a babá de mãe!
Mas, com quase quarenta, eu
estava chegando lá. Onde mesmo? No que ninguém conseguiu responder, eu imaginei
que quando chegasse lá ia ter uma placa com a palavra "fim". Antes
dela, avistei a placa de "retorno" e nela mesmo dei meia volta.
Comprei uma casa no campo
(maneira chique de falar, mas ela é no meio do mato mesmo). É longe que só a
gota serena. Longe do prédio mais alto, do bairro mais chique, do carro mais
novo, da hora extra, da babá quase mãe.
Agora tenho menos dinheiro e mais
filho. Menos marca e mais tempo. E não é que meus pais (que quando eu morava no
bairro nobre me visitaram quatro vezes em quatro anos), agora vêm pra cá todo
fim de semana? E meu filho anda de bicicleta, eu rego as plantas e meu marido
descobriu que gosta de cozinhar (principalmente quando os ingredientes vêm da
horta que ele mesmo plantou).
Por aqui, quando chove, a
Internet não chega. Fico torcendo que chova, porque é quando meu filho,
espontaneamente (por falta do que fazer mesmo) abre um livro e, pasmem, lê. E
no que alguém diz "a internet voltou!" já é tarde demais porque o livro
já está melhor que o Facebook, o Twitter e o Orkut juntos.
Aqui se chama "aldeia"
e tal qual uma aldeia indígena, vira e mexe eu faço a dança da chuva, o chá com
a planta, a rede de cama. No São João, assamos milho na fogueira. Aos domingos,
converso com os vizinhos. Nas segundas, vou trabalhar, contando as horas para
voltar.
Aí eu me lembro da placa
"retorno" e acho que nela deveria ter um subtítulo que diz assim:
"retorno – última chance de você salvar sua vida!" Você provavelmente
ainda está indo. Não é culpa sua. É culpa do comercial que disse: "Compre
um e leve dois". Nós, da banda de cá, esperamos sua visita. Porque sim,
mais dia menos dia, você também vai querer fazer o caminho de volta.
Téta Barbosa é jornalista,
publicitária e mora no Recife.
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